Como colaborador do estudo, eu estava fortemente interessado em explorar os riscos e benefícios de novos materiais em nanoescala. Naquele período, houve grande envolvimento em compreender como esses materiais podem ser perigosos e como podem ser mais seguros.
Avançando rápido para algumas semanas atrás, os nanotubos de carbono foram notícia outra vez, mas por um motivo muito diferente. Desta vez, houve indignação não sobre os riscos potenciais, mas porque o artista Anish Kapoor tem direitos exclusivos de fazer arte com o pigmento à base de nanotubos de carbono - conhecido por ser um dos mais pretos pigmentos já feitos.
As preocupações que até mesmo os defensores da nanotecnologia tiveram no início dos anos 2000 sobre possíveis riscos sanitários e ambientais - e seu impacto sobre investidores e na confiança do consumidor - parecem ter evaporado.
Mas o que mudou?
Preocupações com nanotubos de carbono ou a falta delas
O pigmento no centro da história de Kapoor é um material chamado Vantablack S-VIS, desenvolvido pela empresa britânica Surrey NanoSystems. É uma tinta spray à base de nanotubos de carbono tão preta que as superfícies revestidas com ela refletem quase nenhuma luz.
O Vantablack original era uma especialidade de revestimento de nanotubos de carbono projetada para uso no espaço com o fim de reduzir a entrada de quantidade de luz dispersa nos instrumentos óticos espaciais. A distância da realidade cotidiana fazia o Vantablack parecer bastante seguro. Seja qual for a sua toxicidade, as chances de penetrar no corpo de alguém eram muito pequenas. Não era não-tóxico, mas o risco de exposição era ínfimo.
Em contraste, o Vantablack S-VIS é projetado para ser usado onde as pessoas podem tocar a substância, inalar ou mesmo (não intencionalmente) ingerir.
Para ser claro, o Vantablack S-VIS não é comparável ao amianto - os nanotubos de carbono que o baseiam são muito curtos e muito bem ligados para se comportarem como fibras de amianto do tipo agulha. No entanto, a combinação de inovação, baixa densidade e elevada área superficial, juntamente com a possibilidade de exposição humana, levantam sérias questões de risco.
Por exemplo, como especialista em segurança de nanomateriais, eu gostaria de saber se o spray - ou pedaços do material desintegrado de superfícies - pode ser inalado ou penetrar no corpo; como essas partículas se parecem; o que se sabe sobre o quanto o tamanho dos materiais, a forma, a área de superfície, a porosidade e a química afetam a capacidade de danificar as células; se podem agir como "cavalos de tróia" e transportar materiais mais tóxicos para o corpo; e o que se sabe sobre o que ocorre quando vão para o meio ambiente.
Essas são perguntas altamente relevantes para a compreensão se um novo material pode ser perigoso em uso inadequado. Além disso, é notável a ausência da cobertura da mídia em torno do Vantablack S-VIS. O seu uso original era aparentemente seguro, mas as pessoas querem saber os impactos. O novo uso parece mais arriscado e não há um debate sobre segurança. O que aconteceu com o interesse público sobre possíveis riscos da nanotecnologia?
Financiamento federal em torno da segurança da nanotecnologia
Até 2008, o governo federal dos EUA estava injetando quase US $ 60 milhões por ano em pesquisas de saúde e sobre os impactos ambientais da nanotecnologia. Este ano, as agências federais dos EUA estão propondo investir US $ 105,4 milhões em pesquisas para entender e abordar potenciais riscos da nanotecnologia para o meio ambiente e saúde. Isto representa um aumento maciço de 80% em comparação com oito anos atrás, e reflete as preocupações em curso sobre o que não sabemos a respeito dos riscos potenciais de materiais em nanoescala propositadamente desenhados e engenheirados. Pode-se argumentar que talvez o investimento na investigação de segurança da nanotecnologia tenha alcançado uma das suas intenções originais, pelo impulsionamento da confiança do público na segurança da tecnologia. No entanto, a investigação em curso sugere que, mesmo se as preocupações do público tivessem se dissipado, os anseios ainda estão muito vivos privadamente. Eu suspeito que a razão para a falta de interesse público é simples. É mais provável que a segurança da nanotecnologia não chegue ao radar público por que os jornalistas e outros comentaristas simplesmente não percebem que devem direcionar holofotes para o tema.
Responsabilidade sobre risco
Com o nível atual de investimentos dos EUA, parece razoável supor que há muitos cientistas de todo o país que sabem uma coisa ou duas sobre segurança da nanotecnologia. E há quem, se confrontado com uma aplicação desenhada para pulverizar os nanotubos de carbono em superfícies que possam posteriormente serem tocadas, esfregadas ou raspadas, pode hesitar em dar respostas não qualificadas. No entanto, no caso do Vantablack S-VIS, houve uma notável ausência de posicionamento de tais especialistas de segurança da nanotecnologia na cobertura da mídia.
Esta falta de engajamento não é muito surpreendente - comentar publicamente sobre temas emergentes é algo que raramente treinamos ou incentivamos os nossos cientistas a fazer.
E, no entanto, onde as tecnologias estão sendo comercializadas ao mesmo tempo em que a sua segurança está sendo pesquisada, há uma necessidade de linhas claras de comunicação entre cientistas, usuários, jornalistas e outros formadores de opinião. Caso contrário, de que outra forma é que as pessoas vão saber quais as perguntas que devem fazer e como podem estar sendo enganadas?
Em 2008, iniciativas tais como as do Centro de Nanotecnologia Biológica e Ambiental (CBEN), da Universidade de Rice, e o Projeto sobre Nanotecnologias Emergentes (PEN), do Centro Internacional Woodrow Wilson para Acadêmicos (onde atuei como conselheiro científico), levaram este papel a sério. Esses e outros programas trabalharam próximos a jornalistas e outros para garantir um diálogo público informado em torno das utilizações seguras, responsáveis e benéficas da nanotecnologia.
Em 2016, não existem programas equivalentes que eu conheça - os financiamentos do CBEN e PEN chegaram ao fim há alguns anos.
Isso, eu argumento, precisa mudar. Desenvolvedores e consumidores têm uma necessidade maior do que nunca de saber sobre o que deveriam estar se perguntando para garantir produtos de nanotecnologia responsável e evitar danos imprevistos à saúde e ao ambiente.
Alguns dos ônus aqui residem nos próprios cientistas em fazer conexões adequadas com os desenvolvedores, consumidores e outros. Mas, para isso, eles precisam do apoio das instituições em que trabalham, bem como das organizações que os financiam. Esta não é uma ideia nova - é evidente que existe um longo e permanente debate sobre como garantir que a investigação acadêmica possa beneficiar as pessoas comuns.
No entanto, permanece o fato de que as novas tecnologias passam muito facilmente abaixo do radar da avaliação crítica do público simplesmente por que poucas pessoas sabem quais perguntas elas devem fazer sobre os riscos e benefícios.
Falar publicamente sobre o que é conhecido a respeito dos riscos potenciais e o que não é - e as perguntas que as pessoas podem querer perguntar - vai além de manter a confiança do investidor e do consumidor, a qual, para ser honesto, depende mais de uma percepção de segurança do que lidar com risco. Em vez disso, vai se chegar ao núcleo do que isso significa para engajar a pesquisa e a inovação na responsabilidade social.
Divulgação
*Andrew Maynard já recebeu financiamento de institutos nacionais de Saúde para pesquisa de segurança de nanomateriais. Anteriormente, foi assessor científico chefe do Projeto sobre Nanotecnologias Emergentes.
Fonte: The Conversation
Coluna originalmente publicada em 29/03/2016